É tanta coisa se passando pela minha cabeça, que às vezes eu acabo por dar importância à coisas tão insignificantes que nem me dou conta. Ao menos tenho tido boas oportunidades de notar e admitir essa falta de tolerância e, na maioria das vezes, consertá-las.
Ontem foi um dia tenso em todos os sentidos - mas não vou me aprofundar nos meus tumultos cotidianos - e foi automático que eu repassasse certas emoções ao meus pequenos filhotes.
Praticamente passei o dia aos berros, sem paciência, exigindo deles posturas e atitudes tão ou mais adultas que as minhas. Parece que meu senso de realidade não enxergava que são crianças que não chegam nem aos 5 anos de idade.
E parece que quanto mais a gente briga, esbraveja, grita, mais as coisas ficam difíceis de serem controladas. Assim, ao chegar o fim da noite, eu estava cansada, apática, irritada e com uma grande angústia a corroer-me a alma.
Estão os dois de pijamas e dentes escovados.
Enquanto subimos as escadas, a Rebecca pede:
- Mamãe, conta uma historinha hoje?
Preciso falar que minha resposta foi não? Áquela altura eu só queria vê-los dormindo para poder descansar. Mas não me contive em dizer apenas não: expliquei o motivo.
- Hoje vocês não merecem! Desobedeceram muito a mamãe. Eu precisei pedir mil vezes pra vocês ficarem quietos. E vocês não me ouviam de jeito nenhum. Então hoje vão ficar sem historinha.
Pelo incrível que pareça, não houve lamentação. Ambos deitaram quietos. Cobri a pequena, dei um beijo e um abraço de boa noite. Antes que eu pudesse cobrir o Biel, ele senta e me olha:
- Desculpa, mamãe. A gente não vai mais fazer isso! É que o dia estava tão legal. Teve macarrão na escolinha que eu adoro muito. Depois a vovó chupou cana com a gente. Eu brinquei de bola com a Bebecca. A gente foi na casa da tia Cheche. Eu estava muito feliz e por isso não queria ficar quieto. Eu não queria que a noite chegasse. Desculpa por ter deixado você tão triste.
Toma, Elaine, outra bofetada! Ali, vendo aqueles olhinhos me pedindo perdão, eu enxerguei o quanto fui ignorante. E aqueles mesmos olhinhos me pediam paciência, porque são crianças. Meu Deus, meu filho curtindo o dia, sentindo felicidade e o que foi que eu fiz? Gritei, gritei, gritei. E por quê? Porque ele não parava de pular ou porque enrolou um pouco mais para tomar banho... porque esperou que eu repetisse 3 vezes que era para abandonar o quintal e entrar ou porque estava comendo devagar porque gargalhava com a irmãzinha na mesa.
Ai, que vontade de bater com a cabeça na parede. A bofetada imaginária que eu levava doía nas duas faces. E eu só consegui permanecer em silêncio, com vergonha da minha estupidez.
Abracei-o e apaguei as luzes.
Ah, não perdi a oportunidade... corri na estante, peguei um livro e corri falando alto:
- A história de hoje é da "Galinha Sem Ovo Na Boca do Povo"...
Sei que não consertei tamanho estrago, mas, ao menos, tentei remendar.