quinta-feira, 4 de outubro de 2012

PASSEIO NA FEIRA




Nunca vou me cansar de dizer que crianças são incríveis. A cada dia que passa fico mais convencida disso e lamento profundamente que nós, adultos, perdemos o encanto, a inocência, a simplicidade e a ingenuidade.
Já faz um bom tempo que não folgo mais aos sábados. Muitas vezes também acabo tendo que trabalhar aos domingos e, infelizmente, acabo por não participar de todos as pequenas grandes descobertas que meus filhos fazem. Mas isso não me entristece. Tenho a sorte que certas coisas eles descubram juntamente com meus pais. E essa descoberta ao mesmo tempo também proporciona uma experiência nova não somente aos meus filhos; principalmente para os meus pais. 

Não vou negar, minha irmã e eu não tivemos uma infância de conto de fadas. Às vezes, quando penso em nossa infância, na verdade ela está mais próxima de um conto de assombração. Passamos por coisas que, provavelmente, só nós duas sabemos e, por mais que expliquemos, ninguém nunca conseguirá entender ao certo o que passamos. Até hoje não consigo achar um único adjetivo para simplificar o que foi minha infância. Não sei se foi boa ou ruim. E sei que também não foi de toda ruim, mas muito longe de ser boa.  Quando paro para pensar no que foi minha infância, fico atônita e não consigo sentir nada. É como se houvesse uma lacuna na minha vida, a qual eu não vivi. Procuro pensar e relembrar algumas coisas, mas sempre pisco e já me vejo com 13,14 ou 15 anos. Tenho muitas mágoas e chateações; talvez por isso minha mente bloqueie recordações traumáticas. 
Infelizmente, só depois que me tornei mãe é que pude começar a observar as coisas com outros olhos. Se tive momentos quando criança que me chocaram e que me fizeram apagá-los não são única e exclusivamente por "culpa" dos meus pais. Agora vejo que eles NUNCA foram omissos ou desleixados. Assim como eu agora, com o Gabriel e com a Rebecca, eles erraram tentando acertar, tentando fazer o melhor. E bem diferente de mim, que tive instrução, li muito, tive o privilégio de alcançar a pós graduação e ter muitas experiências para tomar as decisões que tomo e que nem sempre são 100% perfeitas, tanto meu pai quanto minha mãe não foram preparados, não tiveram instrução, não puderam se informar sobre tudo que precisavam fosse com amigos, profissionais da área, etc e tal. Eles se quer tiveram o privilégio de ter o auxílio dos pais próximos. Tanto Dona Flor quanto Seu Dôgas se aventuraram num mundo louco. Meteram as caras, foram guerreiros. Construiram uma família praticamente sem estrutura, sem alicerce, e como TODAS as pessoas, NÃO SÃO perfeitos. Erraram. E erraram muito. Erraram feio. Mas DUVIDO que erraram intencionalmente alguma vez. DUVIDO que erraram sabendo que havia algum erro. E por mais errados que tivessem, NUNCA deixaram de arcar com as consequências. E por mais diferente que tenha sido, sempre tiveram AMOR. Um amor que não foi expressado como deveria ter sido; mas eu SEI que houve amor. E, mais uma vez, ressalto que, INFELIZMENTE, eu só tenha me dado conta de tudo que relatei agora, depois que me tornei mãe e vi o quão difícil é ser perfeita para os filhos. Espero que, futuramente, o Gabriel e a Rebecca possam e consigam me perdoar por tudo que deixei de fazer e, principalmente, por tudo que fiz sem ter conseguido superar as expectativas que eles tiveram, tem e terão.
Acho incrível meus pais terem a oportunidade de estarem bem próximos dos meus filhos porque, de uma maneira ou de outra, eles acabam revivendo ou, muitas das vezes, vivendo momentos que não puderam viver com minha irmã ou comigo; não que eles não quisessem, mas na maioria das vezes porque não podiam, principalmente em questões financeiras.
E o "causo" que se descrevo abaixo é um momento de descoberta que meus filhos tiveram como acompanhantes meus pais.

Crianças tem sonhos que nunca entederemos. Crianças ficam deslumbradas com as menores coisas. Crianças se empolgam com o simples.
Acreditem: um dos grandes sonhos/desejos do Gabriel e da Becca era conhecer a feira. Por mais que eu explicasse e mostrasse fotos, eles não compreendiam o que era uma "feira livre". A única coisa que se passava na mente deles era um local encantado, cheio de frutas saborosas e fresquinhas. É, sei que não é nada comum, mas meus filhos ADORAM frutas; na verdade, ADORAM tudo que é de comer... são ÓTIMOS de garfo!!!
De tanto ouvir meus filhos pedirem para ir até a feira, meus pais decidiram separar um sábado para levá-los ao paraíso. "Um lugar fabuloso onde o vovô compra coisas deliciosas!" - palavras da Rebecca.
Naquele sábado acordei cedo e me aprontei para o trabalho. Deixei os dois dormindo e confesso que estava muito curiosa por saber como seria a experiência de conhecer a tão encantadora feira.
Meu dia foi agitadíssimo. Tão agitado que não consegui ligar para casa e saber como tivera sido o passeio. Cheguei em casa e mal abri a porta e já fui perguntando:
- E aí, filhotes? Como foi a feira? 
- Maravilhoso! - sorriu felicíssimo o Gabriel. - Mamãe, eu comi melancia, abacaxi... um montão de fruta docinha. Ah, e quando a gente tava voltando o vovô comprou pastel e um negócio verde de beber!!!
O tal negócio verde de beber era o tão famoso caldo de cana.
Achei estranho porque a Rebecca permaneceu calada e desviava o olhar do meu.
- O que foi, Becca? Por que essa cara? Você deu trabalho pra vovó e pro vovô na feira, né?
- Eu não fiz nada! - respondeu prontamente.
- E o que aconteceu? Você gostou da feira?
A monocelha ficou arqueada e com aquela expressão de angústia, ela soltou desesperadamente, sem vírgula ou pausa.
- Eu não vou lá nunca mais que "lugae" quente eu não vou lá de jeito nenhum um povo "apeitando" a gente e "guitando" um montão de coisa eu fiquei cansada e suei e meu ouvido doeu não não não "queio" mais...
Como tantas outras vezes, me segurei para não rir.
- Mas e o pastel? Nem do pastel e do negócio verde de beber você gostou?
- "Deusu" me livre. Aquele negócio "veide" é de capim e eu não como mato. E o pastel é melhor em casa. Pastel na feira nunca mais. Eu quero o pastel que você "traizi" e a gente come em casa, sem aquele montão de gente "apeitando" a gente e "guitando".
Olha que engraçado. O que para um foi um sonho concretizado para o outro foi um perfeito pesadelo.
Crianças... que maravilha tê-las em minha vida!
Pais... que maravilha ainda tê-los em minha vida!

CRIANÇAS e PAIS... QUE MARAVILHA TÊ-LOS EM MINHA VIDA!!!